Ayvu Rapyta - Palavra Habitada
Somos um grupo de contadores de histórias
que tem como fio condutor as narrativas contadas e costuradas na roca do tempo das culturas.
Buscamos no prazer das leituras, habitar com sonho e magia no coração das pessoas.
www.ayvurapyta@gmail.com e também no facebook

quarta-feira, 25 de junho de 2008

Sonhos e bibliotecas - Edmir Perroti

Nos anos 30 do último século, um grupo de intelectuais, liderado por Mário de Andrade, sonhou um projeto cultural de envergadura para a cidade de São Paulo: a criação de bibliotecas públicas, abertas à população em geral, em vários pontos da cidade. A iniciativa foi – e, poderá continuar sendo, se retomada em termos contemporâneos – contribuição fundamental à luta contra o analfabetismo e o iletrismo que, lastimavelmente, marcam ainda hoje nossa cena educacional e cultural. Reconhecendo a importância de formar leitores, ou seja, o papel educativo, cultural e socializador das bibliotecas, o grupo, além das dirigidas para adultos, idealizou também a criação de uma rede voltada especificamente para crianças e jovens, das quais a Biblioteca Infanto-Juvenil Monteiro Lobato, criada em 1935, foi a primeira. Tal movimento desembocou na criação da maior e mais complexa rede de bibliotecas públicas do País, cujo apogeu durou desses anos iniciais até os 60, quando a massificação começa a se impor como padrão dominante das políticas públicas de educação e cultura no País. A partir dos anos 70 esse formidável patrimônio cultural perde o rumo e até hoje, infelizmente, não conseguiu se refazer nem sequer compreender o que lhe aconteceu e está acontecendo. Quem, por exemplo, freqüentou a Biblioteca Monteiro Lobato em seu período áureo, encontrou ali um ambiente estimulante e vivo, onde era possível estar em contato com acervos diversificados e atualizados de periódicos e livros, alguns, inclusive, em línguas estrangeiras. Além de importante centro irradiador, a biblioteca “dos modernistas” era local de intensa produção e intercâmbio simbólicos, de interações de importância essencial à inscrição dos seus freqüentadores nas tramas da criação cultural. Na Monteiro Lobato, além das atividades fundamentais de leitura, da Hora do Conto, havia oficinas permanentes de criação literária, de artes plásticas, de confecção de jornais; havia, também, cotidianamente, encenações teatrais, debates, palestras, encontros com autores e muitas coisas mais. O jornal A Voz da Infância fez história, na biblioteca. Muitas cabeças boas, que produziram e até hoje produzem informação e cultura no País, publicaram seus primeiros escritos ali. Da mesma forma, criações teatrais do Teatro da Biblioteca Monteiro Lobato (Timol) emocionaram e fizeram pensar milhares de crianças. Um ator e diretor hoje conhecido de todos, Marcos Caruso, não só se formou nesse grupo, como, depois de adulto, dirigiu-o por bastante tempo. Contemporânea da primeira biblioteca infantil criada em Paris, em 1925, a Biblioteca Monteiro Lobato era motivo de orgulho especial para aqueles que tinham oportunidade de freqüentá-la. Suas realizações, suas dinâmicas, aliadas à imponência do novo prédio que até hoje resiste, implantado nos anos 50 no Centro de São Paulo, apontavam não só para a memória cultural da produção infanto-juvenil, mas para o presente e o futuro. A Monteiro Lobato alimentava esperanças. A partir dela, podíamos vislumbrar cidadãos capazes de tomar os destinos do País nas mãos.Apropriação ou expropriaçãoExemplo como esse nos permite chamar a atenção para a diferença existente entre um mero depósito de livros e um ambiente efetivo de conhecimento e cultura. Aqueles que tiveram a oportunidade de freqüentar a Lobato sabem que existem diferenças fundamentais entre políticas públicas de democratização e políticas de massificação cultural, entre práticas de apropriação e práticas de expropriação simbólica, vigentes entre nós desde a colonização. As primeiras acolhem, abraçam, abrem espaço, incentivam as trocas, o livre-intercâmbio de idéias; as segundas banem, afugentam, excluem. Para superar condições de mero entreposto e tornar-se espaço de cultura vivo, dinâmico, atrativo, a biblioteca não pode simplesmente existir, entregando ao acaso sua dinamização. É preciso atuar, agir, criar metodologias e estratégias compatíveis com projetos históricos empenhados em reverter o quadro de exclusão que sempre marcou a vida nacional; é preciso combinar opções de políticas públicas inclusivas com práticas culturais da mesma natureza, criando-se uma dinâmica entre macro e micro ações visando à participação e inclusão de todos nos processos de conhecimento e cultura.Ao mesmo tempo que uma biblioteca contemporânea deve ser aberta a novos leitores (e também aos não leitores), é indispensável concebê-la, também, como plataforma de lançamento, ponto de acesso dos diferentes públicos a circuitos culturais amplos e diversificados. As bibliotecas devem ser como as estações, ou seja, pontos de chegada e de partida em direção aos demais dispositivos culturais da cidade, do País, do mundo. Em suma, trata-se de inserir os sujeitos não apenas na biblioteca, mas nas ricas e intrincadas tramas simbólicas de nosso tempo. A qualidade e o compromisso público dos que nela trabalham também são elementos centrais nas políticas de apropriação cultural. Sem compreensão do papel fundamental que exercem, sem formação de base e continuada, compatível com tal compreensão, sem interesse efetivo pelos bens simbólicos, dificilmente esses profissionais serão percebidos ou se perceberão como protagonistas culturais. Não há, pois, como deixar de considerar a qualidade essencial dos mediadores. Em última análise, é no “aqui e agora” do concreto que os atos culturais ganham sentido. Mediadores desmotivados, despreparados, desinteressados, alheios às questões culturais gerais, bem como às dinâmicas singulares de seu universo imediato, não estão em condições de atender às exigências feitas por projetos destinados a reverter os caminhos excludentes da cultura no País. Elo com a comunidadeO compromisso com uma biblioteca ativa, inventiva e participativa implica também criação de vínculos fortes com o meio em que ela se encontra. Nesse sentido, torna-se necessário não só levar a biblioteca à comunidade, mas também trazer essa e sua memória, suas histórias, suas realizações significativas para dentro da biblioteca. Uma instituição distante não cria elos fortes e duradouros com seu público.É preciso transitar pela cultura local, da mesma forma que pela universal. É preciso buscar e coletar a memória da comunidade, registrá-la, dar-lhe forma e sentido, recriá-la, disponibilizá-la sob diferentes formas, como exposições, boletins, livros e álbuns fotográficos, tal como faz a Estação Memória, projeto criado por nós, na USP, e implantado na Biblioteca Infanto-Juvenil Álvaro Guerra, no bairro de Pinheiros, em São Paulo. A atenção voltada à cultura local é contraponto necessário aos processos de globalização, num movimento dinâmico e essencial de interpenetração entre o próximo e o distante, o aqui e o lá, o “nosso” e o “do outro”. A biblioteca contemporânea não pode aceitar o papel de entreposto de signos que as políticas e práticas de expropriação cultural sempre adotaram e continuam adotando. Deve, antes, estar antenada com as exigências de seu tempo e momento, tal como preconizou, em sua época, o grupo de intelectuais ligado a Mário de Andrade. Assim consideradas, as bibliotecas herdadas dos “modernistas” poderão ser redimensionadas, desempenhando novamente o papel cultural essencial do passado. Não serão, em tais condições, dispositivos restritos a pequenos grupos, pertencentes em geral às elites econômicas ou intelectuais. Serão, como em várias partes do mundo e ao alcance de todos, recursos essenciais de participação na cultura. Nossos modernistas, com certeza, estarão felizes se tivermos a capacidade de reativar sonhos de inteligência e beleza na vida do País.
Edmir Perroti é professor da Escola de Comunicação e Artes da USP.
FONTE: Revista Carta na Escola - 09/06/2008

segunda-feira, 23 de junho de 2008

Nascem flores com o tempo

Sentir, eu sei, tem seu preço
dores, prazeres, amores
nunca erram meu endereço
a vida me quer sentindo
à flor da pele desde o começo
sentir, eu sentirei até o fim
nascem flores com o tempo
flores no vaso é com vocês
eu vou regar um jardim.

Ricardo Corona
(poeta curitibano)

domingo, 15 de junho de 2008

Compartilhamento...

Caros companheiros da aventura de viver e formar leitores,

Gostaria de compartilhar fragmentos de um texto de Guiomar de Grammont,que me comove.Lembrando que comover é nos tirar do lugar,nos tirar de onde estamos,que ele possa acompanhá-los,inspirá-los e fortalecê-los nos momentos de dúvida e "sozinhez".Tenham um ótimo dia,um grande abraço solidário e quixotesco,Delani.
"A pensar a fundo na questão, eu diria que ler devia ser proibido afinal de contas, ler faz muito mal às pessoas: acorda os homens para realidades impossíveis, tornando-os incapazes de suportar o mundo insosso e ordinário em que vivem.
A leitura induz à loucura, desloca o homem do humilde lugar que lhe fora destinado no corpo social. Não me deixam mentir os exemplos de Dom Quixote e Madame Bovary. O primeiro, coitado,de tanto ler aventuras de cavalheiros que jamais existiram,meteu-se pelo mundo afora, a crer-se capaz de reformar o mundo, quilha de ossos que mal sustinha a si e ao pobre rocinante. Quanto à pobre Emma Bovary, tornou-se esposa inútil para fofocas e bordados, perdendo-se em delírios sobre bailes e amores cortesãos.
Ler realmente não faz bem. A criança que lê pode se tornar adulto perigoso, inconformado com os problemas do mundo, induzido a crer que tudo pode ser de outra forma. Afinal de contas, a leitura desenvolve um poder incontrolável. Liberta o homem excessivamente. Sem a leitura, ele morreria feliz, ignorante dos grilhões que o encerram. Sem a leitura, ainda, estaria mais afeito à realidade quotidiana, se dedicaria ao trabalho com afinco, sem procurar enriquecê-lo com cabriolas da imaginação.
Sem ler, o homem jamais saberia a extensão do prazer. Não experimentaria nunca o sumo Bem de Aristóteles: o conhecer. Mas pra que conhecer se, na maior parte dos casos, o que necessita é apenas executar ordens?Se o que deve, enfim, é fazer o que dele esperam e nada mais?
Ler pode provocar o inesperado. Pode fazer com que o homem crie atalhos para caminhos que devem necessariamente ser longos. Ler pode gerar a invenção. (...)
Além disso, a leitura promove a comunicação de dores, alegrias, tantos sentimentos. A leitura é obscena. Expõe o íntimo, torna coletivo o individual e público, o secreto, o próprio. A leitura ameaça os indivíduos, porque os faz identificar sua história a outras histórias. Torna-os capazes de compreender e aceitar o mundo do Outro. Sim, a leitura devia ser proibida. Ler pode tornar o homem perigosamente humano."
Lani Alves(in memórian)

A Bolsa Amarela - O 1º livro a gente nunca esquece!


"Eu tenho que achar um lugar pra esconder as minhas vontades." Assim começa o primeiro livro que levei emprestado da biblioteca da escola na 3ª série! A frase inicial fez com que Raquel e eu continuássemos juntas até hoje, ambas buscavam este lugar secreto de guardar vontades... Lembro o quanto o episódio do galo chamado Terrível pôs-me a pensar, na verdade não parava um minuto de pensar que haviam costurado o pensamento dele com linha bem forte pra que achasse que só podia ser galo de briga, e nem imaginam o que aconteceu com ele... (desculpem não dá para contar a história, o nº de caracteres não suporta, a danada mania de contador de histórias, falar e falar, então vocês terão que ler) Pois bem,pra todo mundo, todo mundo mesmo, leio este livro, ele representa muitas coisas para mim, especialmente autonomia, como já citei, foi meu primeiro empréstimo, levei para casa e depois de sete dias estava lá para buscar outros, tinha até carteira da biblioteca com foto 3x4.
Chegou o dia de conhecer a “mãe" da bolsa amarela, Lygia Bojunga veio a Belém para uma conversa literária no IAP, descobri que muitos na platéia tinham histórias com este livro, no final pedi pra que ela dedicasse o meu exemplar a Sofia, já falei a ela que esta é a herança que deixarei, uma bolsa toda amarela!
Andréa Cozzi

A serpente e o vagalume - Quem lembra dessa história?

Conta a lenda que uma vez uma serpente começou a perseguir um vagalume, que fugia rápido com medo da feroz predadora; a serpente nem pensava em desistir. Fugiu um dia e ela não desistia, dois dias e nada... No terceiro dia, já sem forças o vagalume parou e disse à cobra:Posso lhe fazer três perguntas? Não costumo abrir esse precedente para ninguém, mas já que vou te devorar mesmo, pode perguntar...
Pertenço à sua cadeia alimentar ? Não.
Eu te fiz algum mal?Não.
Então, por que você quer acabar comigo? Porque não suporto ver você brilhar...

quinta-feira, 12 de junho de 2008

Blá, blá, blá, blá...


Este grupo de contadores de história do bosque, cada figuraças, parece um imenso livro aberto, daqueles cheios de coletâneas de todos os gêneros, eis alguns deles:
Tem o meu menino inteligente, carinhoso e muito educado, este de quem falo, me fala macio e finge que entende o que nem escutou ,fica sempre ao meu lado, tem também o gênio da lâmpada, porém, com certeza não me concederá os três desejos, outro sim, se eu deixar, roubará minha alma, assim como rouba minha recates ao me abraçarE a madrinha, tem cara de tudo menos de fadinha, seu sorriso é um grande enigma, tem também a mãe de todos, que doçura, tem a que se sente, a voz empossada, é uma realeza só, e a psiu com seu jeito zen nos encanta, tem a menina ,que é só sorriso e como brilha o seu sorriso , tem a que inventa ,enlaça, traça e abraça , tem de tudo neste grupo tem a que chora por tudo e como é linda quando chora. Bem ainda tem muitos outros mas fica pra próxima tá? Deu vontade de nos conhecer? Venham, tem lugar pra todos, aguardamos vocês, não percam sábado dia 21/06/08, Bosque Rodrigues Alves entrada pela Perebebuí ,bla bla bla, bla bla bla bla.
Rosilda Costa

terça-feira, 10 de junho de 2008

A língua do nhém,nhém,nhém


Se eu pudesse escolher momentos para guardar para sempre, certamente o da apresentação de sexta seria um, lembrar tal momento é sonhar um sonho lindo, tudo foi mágico, desde o meu levantar da cadeira movida por uma força (coragem) vinda não sei de onde, como o andar e falar ao mesmo tempo, lutando para lembrar tudo o que havia decorado a algum tempo, a minha voz nunca foi tão bela, forte, marcante ecoando na minha mente e no meu coração e naquela sala sedenta de emoções, puft até que tudo se apagou, zerou completamento, disfarcei, sorri e continuei com algo que veio rapidamente a minha cabeça, não importa,não deu para quebrar o encanto, o Marçal, o Paulo e os outros contadores seguraram a magia. E o que ficou em mim foi os sorrisos de uns, e a perplexidade de outros, enfim cada um com sua vivencia experimentou sua emoção pessoal, sei não, só sei que foi muito bom ter estado lá,impagável.
Obrigada, amei a maneira como fui “incentivada” livre e espontânea pressão, era tudo o que eu precisava, afinal sou uma “crionça” e os desafios viram brincadeiras pois:
“Gostoso é pintar, escrever e dançar, fazer o que pode a sua maneira, a vida se torna uma brincadeira.
Só é possível àquele que crê, tudo é possível àquele que crê.”
Rosilda Costa

domingo, 1 de junho de 2008

Memória da Reunião



Em 31/05/08, Jardim Botânico Bosque Rodrigues Alves, Chalé de ferro. E cá estávamos nós em nosso ninho de ave... Quem já foi as reuniões do grupo sabe do que estou falando, nos sentimos acolhidos e aconchegados ao redor da colcha de retalhos emprestada pela Srtª Sofia perna de gia mais corre que nem cutia(ultimamente gosta de ser chamada de fada brilhante que arruma o quarto).Fechamos os estudos sobre o percurso histórico do contador com o texto da Cléo Busatto "A contação de histórias no século XXI: Um encontro mediado pelo suporte digital” (texto extraído do livro A arte de contar histórias no século XXI – tradição e ciberespaço. Petrópolis: Vozes, 2006).Ficou como encaminhamentos:· A necessidade de agendarmos o auditório do bosque para conhecermos melhor os CDs-rom da Cléo “Contos e encantos dos quatro cantos do mundo” e “Lendas brasileiras”, precisamos caminhar rumo ao quarto movimento que o texto acima citado nos traz – um sopro no ciberespaço;· Precisamos amadurecer a idéia do batizado do grupo (cadê o nome do neném?);· Mapear os grupos ou contadores de histórias de Belém;· Dar continuidade a costura de nossa colcha de retalhos;· Participar do I Encontro Municipal de Informática, Literatura e Educação – Leituras e leitores. 03 a 06 de Junho, 08:00 as 12:00, NIED- Núcleo de informática educativa.Neste último encaminhamento é necessário que o grupo se faça presente, pois faz parte de nossa formação enquanto mediadores de leitura, o evento foi pensado com carinho pelo SISMUBE e NIED, terá como palestrantes o Profº Benedito Nunes, Profª Stella Pessoa e Profª Lilia Chaves.Os que fazem parte da SEMEC receberam comunicado oficial nos seus espaços educativos para obterem liberação durante o evento.Portanto, não há impedimentos para alimentarmos nossas almas de leitores!! Vejo vocês lá.
Andréa Cozzi
LOUCURA? SONHO? TUDO É LOUCURA OU SONHO NO COMEÇO.NADA DO QUE O HOMEM FEZ NO MUNDO TEVE INÍCIO DE OUTRA MANEIRA,MAS JÁ TANTOS SONHOS SE REALIZARAM QUE NÃO TEMOS O DIREITO DE DUVIDAR DE NENHUM”.(MONTEIRO LOBATO. Miscelâneas. São Paulo: Brasiliense. 1956. 7ª. edição p. 178)

Minha vó contava...E eu jamais imaginava que era de Perrault, acho que nem ela.



As Fadas

Contos de Perrault


Era uma vez uma viúva que tinha duas filhas. A mais velha se parecia tanto com ela, no físico e no temperamento, que quem via a filha, via a mãe. As duas, mãe e filha, eram tão desagradáveis e tão orgulhosas que viver com elas era impossível. A caçula, que era o retrato do pai, por sua doçura e bondade, tinha ainda a seu favor o fato de ser uma das moças mais lindas que se pode imaginar. Como todo mundo gosta é de quem lhe é semelhante, a mãe era louca pela filha mais velha e, por outro lado, tinha uma terrível aversão pela caçula. Obrigava-a a comer na cozinha e a trabalhar sem descanso.Cumpria à pobre menina, entre outras coisas, ir buscar água duas vezes por dia num lugar distante uma boa meia-légua da sua casa, de onde trazia um grande cântaro cheio até as bordas. Um dia ela se achava junto à fonte quando apareceu uma pobre mulher que lhe pediu um pouco de água para beber. "Pois não, minha boa mulher", disse a bela moça, e, depois de lavar rapidamente o cântaro, encheu-o onde a água da fonte era mais pura e cristalina e o ofereceu à mulher, segurando-o para que ela pudesse beber mais à vontade. Após ter bebido, a boa mulher lhe disse: "Você é tão bonita, tão gentil e tão boa que não posso deixar de lhe conceder um dom (pois ela era uma fada que havia assumido a forma de uma mulher pobre da aldeia a fim de ver até onde ia a bondade daquela jovem). Você terá o dom de fazer sair pela sua boca, a cada palavra que disser, uma flor ou uma pedra preciosa".Quando a linda moça chegou em casa, a mãe repreendeu-a por voltar tão tarde da fonte. "Peço-lhe perdão, minha mãe", respondeu a pobre moça, "por ter demorado tanto" - e ao dizer essas palavras saíram de sua boca duas rosas, duas pérolas e dois enormes brilhantes. "Que vejo?", disse a mãe grandemente admirada. "Parece-me que estão saindo de sua boca pérolas e brilhantes! De onde vem isso, minha filha?" (Era a primeira vez que a chamava de filha). A pobre moça contou-lhe ingenuamente tudo o que lhe havia acontecido, não sem deitar pela boca, enquanto falava, uma infinidade de diamantes. "Com efeito", falou a mãe, "preciso mandar minha filha até lá. Olhe só, Franchon, veja o que está saindo da boca de sua irmã, quando ela fala. Você não gostaria de ter também esse dom? É só você ir buscar água na fonte, e quando uma pobre mulher lhe pedir um pouco de água para beber você deverá atendê-la com toda a gentileza." - "Era só o que me faltava", retrucou a grosseirona da outra filha, "ir buscar água na fonte!" - "Pois quero que você vá", retrucou a mãe, "e agora mesmo!"Ela foi, mas sempre resmungando. Pegou o mais bonito vaso de prata que havia na casa e mal tinha chegado à fonte viu sair do bosque uma dama esplendidamente vestida, que lhe pediu um pouco de água. Era a mesma fada que havia aparecido à sua irmã, mas que agora assumira os ares e os trajes de uma princesa, para ver até onde ia a grosseria daquela moça. "Você acha que vim até aqui para lhe dar de beber? Que trouxe um vaso de prata expressamente para dar de beber à ilustríssima? Que beba você mesma, se quiser." - "Você não é nada gentil", retrucou a fada, sem se encolerizar. "Pois bem! Já que é tão pouco prestimosa, eu lhe darei este dom: a cada palavra que disser sairá de sua boca uma cobra ou um sapo".Logo que a mãe a viu chegar, gritou para ela: "E então, minha filha?" - "E então minha mãe?", respondeu-lhe a grosseirona, soltando pela boca duas víboras e dois sapos. "Céus", exclamou a mãe. "Que vejo! É sua irmã a culpada, ela me pagará". E logo correu para lhe dar uma sova. A pobre moça fugiu e foi esconder-se numa floresta próxima. O filho do rei, que retornava da caça, viu-a e a achou tão linda que quis saber o que fazia ali sozinha e qual motivo por que chorava. "Ai de mim, meu senhor", respondeu ela, "a minha mãe me expulsou de casa". O filho do rei, que acabara de ver sair de sua boca cinco ou seis pérolas e um igual número de brilhantes, pediu-lhe que lhe explicasse de onde vinha tudo aquilo. Ela lhe contou toda a sua história. O filho do rei apaixonou-se por ela e, considerando que semelhante dom valia mais do que tudo o que uma noiva pudesse levar de dote, conduziu-a ao palácio do rei seu pai, onde a esposou.Quanto à sua irmã, ela se tornou uma pessoa tão odiosa que sua própria mãe a escorraçou de casa. E a infeliz, depois de ter procurado em vão uma pessoa que a acolhesse foi morrer sozinha num recanto perdido do bosque.
Andréa Cozzi

sábado, 31 de maio de 2008

Minha história de contador...


Meu contato com a arte de contar história está ligada a minha infância, uma infância quase que esquecida por conta do corre-corre da juventude, essa fase em que tudo ocorre de forma rápida, intensa, paradoxal e de muitas descobertas. E foi no meio dessas descobertas e de autoconhecimento que a contação de histórias surgiu na minha vida.Foi num mês de festa, de celebração, outubro, Círio de Nazaré, que me deparei com uma pequena - grande mulher, não era a Nazica, era a Selma. E em meio a ensaios do Auto do Círio e companhia para voltar para casa que ela me falou de contar de histórias... Minha antena de jovem curioso se levantou e já passei fazer mil planos na minha cabeça. Uni meu trabalho voluntário na Igreja com a contação e aí a curiosidade foi se transformando num grande amor...Mas voltando a infância, fui convidado em uma das reuniões a abrir o baú da minha infância e relembrar as histórias que a povoaram; lembrei-me das histórias que a minha avó contava para mim e para os meus primos durante nossas férias no Marajó. Era batata, jantávamos as 18:00h por conta da educação militar do meu avô e logo depois dos trabalhos domésticos ela sentava entre os netos e começava a relatar os causos e lendas do marajó, histórias passadas de geração em geração, que sua avó ex-escarava lhe contou e que agora compartilhava com seus netos , até mesmo para nos afastar dos divertimentos de criança do fim do séc. XX e inicio do XXI, como, os videogames. E foi aí que percebi o quanto minha infância estava repleta de histórias, quem sabe o fato de contar, narrar, talvez esteja no sangue, nessa minha teia familiar.Hoje tenho essa arte na minha vida como uma semente que ainda precisa crescer, mas que já é de grande importância. Ligo essa idéia de contar as minhas preocupações enquanto cidadão consciente do seu papel de tentar ajudar na construção de um mundo melhor, ajudando crianças a se encantarem com os livros, com histórias, com a leitura. E o nosso grupo hoje é fundamental na minha vida, conto os sábados para não perder um encontro, me sinto sempre uma pessoa melhor quando volto pra casa depois dos nossos encontros, me alimenta a alma!!! Porém, o grupo é outra sementinha que está lá, persistente, que foi semeada em muitos campos, mas que ainda não consegue se sustentar sem o apoio; e esse apoio depende de nós, que nos comprometemos e que além do comprometimento e muito mais importante, compartilhamos dos mesmos sonhos e acreditamos no poder da palavra!! Vamos compartilhar dessas histórias?Rodrigo.